Quem foi Chico Mendes e qual seu legado para a proteção da Amazônia
Os tiros de escopeta que tentaram silenciar Francisco Alves Mendes Filho em 22 de dezembro de 1988 tiveram o efeito contrário. O assassinato estampou manchetes no mundo inteiro e o nome de Chico Mendes, seringueiro nascido em 15 de dezembro de 1944, virou sinônimo de ambientalismo. Ainda hoje, segue batizando parques, memoriais e organizações de proteção à Amazônia.
Origem
Chico Mendes nasceu no município de Xapuri, no Acre. Filho de um migrante nordestino que foi para a selva trabalhar como seringueiro, exerceu o ofício desde cedo, acompanhando o pai na floresta Amazônica. Na região, não interessava aos proprietários das terras implantar escolas onde funcionavam os seringais – a maioria dos trabalhadores era analfabeta. Mesmo assim, Chico Mendes aprendeu a ler aos 16 anos, ensinado pelo militante comunista Euclides Távora, que estava exilado em Xapuri.
Contexto de miséria
A borracha enquanto produto de exportação brasileiro já havia chegado ao fim em 1945, mas a exploração dos seringais continuava relevante na economia local, principalmente pelo modelo de exploração em que os trabalhadores recebiam produtos industrializados em troca da matéria bruta. O resultado era uma sociedade miserável, endividada e acuada: qualquer tentativa de revolta ou organização política era sufocada com violência pelos donos dos seringais e pela polícia.
Ativismo político
Na década de 1970, a extração de látex já não era mais viável financeiramente. A política econômica do governo militar no Brasil foi substituir a borracha pela pecuária, criando oportunidade para uma ampla especulação fundiária, acompanhada por desmatamento. Vendo seu único meio de subsistência ameaçado, as famílias e os trabalhadores dos seringais começaram a se organizar politicamente sob a liderança de Wilson Pinheiro, fundador do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de Brasiléia, a primeira entidade sindical criada no Acre. Chico Mendes, aos 31 anos, um dos poucos seringueiros letrados e influenciado politicamente por seu professor, fez parte da diretoria do sindicato.
As ações comandadas por Pinheiro fortaleceram a luta sindical e a proteção da floresta. Uma modalidade era conhecida como “empate às derrubadas”: famílias iam para as áreas ameaçadas de desmatamento e desmontavam os acampamentos dos peões contratados para abrir a mata aos pecuaristas.
Fortalecimento como líder
Depois do episódio conhecido como “mutirão contra a jagunçada”, em que trabalhadores da floresta enfrentaram os capangas que ameaçavam as famílias da região, Wilson Pinheiro foi assassinado em julho de 1980, dentro da sede do sindicato. Chico Mendes assumiu então a liderança dos movimentos ativistas da região. No mesmo ano, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores no Acre, o que o fez ser enquadrado como “subversivo” pela Ditadura Militar. Em 1983, chefiou o STR de Xapuri. E, em 1985, organizou o primeiro Encontro Nacional dos Seringueiros, que reuniu mais de 100 trabalhadores e resultou na formulação da proposta de reforma agrária centrada nas reservas extrativistas.
Respaldo internacional
Por causa do Encontro Nacional dos Seringueiros, Chico Mendes e a luta dos seringueiros passaram a ser reconhecidos mundialmente. O evento foi filmado pelo cineasta inglês Adrian Cowell, que também acompanhou o dia a dia de Mendes. O resultado foi o documentário Eu Quero Viver, lançado em 1987. Em 1988, o líder ambientalista já havia ganhado dois prêmios internacionais: o Global 500, da Organização das Nações Unidas, e a Medalha de Meio Ambiente da Better World Society. Também concedeu entrevistas a jornais e TVs de todo o mundo e recebeu pesquisadores nos seringais.
Morte
Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi assassinado em uma emboscada nos fundos de sua casa. Deixou uma viúva, Ilzamar, e três filhos órfãos: Angela (do primeiro casamento) e Sandino e Elenira. O crime ganhou repercussão mundial e pressão popular. As investigações apontaram o pecuarista Darly Alves como mandante do crime. Ele e seu irmão, Darci, foram condenados a 19 anos de prisão em 1990 por um júri popular.
Legado
A morte de Chico Mendes evidenciou ainda mais os conflitos fundiários na região e a questão do desmatamento. Em 1990, foi criada uma Reserva Extrativista (Resex) batizada em sua homenagem. A reserva abrange sete municípios do Acre em uma área de quase 1 milhão de hectares de floresta preservada. Em 2007, a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, fundou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), uma autarquia federal responsável pela gestão das unidades de conservação da natureza do Brasil.
Por Revista Galileu
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