NASA mostra distribuição de monóxido de carbono com queimadas no Brasil
Por Patrícia Gnipper
“Hey, @NASA, are you sure?”, questionou um usuário do Twitter à agência espacial quando ela mostrou uma imagem de satélite com fumaças visíveis do espaço, provenientes das queimadas que vêm acontecendo na região amazônica. Sim, a NASA tem certeza do que está divulgando e, agora, a agência mostra uma animação em que vemos a distribuição do monóxido de carbono na atmosfera, proveniente desses incêndios.
Segundo dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), somente em 2019 as queimadas na região amazônica já somam mais de 75 mil ocorrências, número mais de 80% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado.
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A nova imagem que agora mostra a distribuição do monóxido de carbono resultante deste cenário foi obtida usando o instrumento AIRS (Atmospheric Infrared Sounder), que fica a bordo do satélite Aqua, monitorando a atmosfera em infravermelho. Ela é resultado de um mapeamento de duas semanas, entre os dias 8 e 22 de agosto, a uma altitude de 5.500 metros, mostrando a pluma de fumaça em expansão na região noroeste da Amazônia, que se direciona rumo ao sudeste brasileiro.
Cada dia da série é feito calculando a média de três dias de medições, técnica usada para eliminar as lacunas de dados. A cor verde indica concentrações de monóxido de carbono em aproximadamente 100 partes por bilhão em volume (ppbv), enquanto o amarelo indica o mesmo em cerca de 120 ppbv, e o vermelho escuro com cerca de 160 ppbv. E os valores locais podem ser significativamente mais altos, diz a NASA.
As partes por bilhão em volume de unidade que foram usadas para indicar as concentrações do monóxido de carbono são o número de unidades de massa do contaminante em questão por 100 milhões de unidades de massa total (no caso, do ar). E vale ressaltar que este poluente em especial contribui para com as mudanças climáticas, além de poluir o ar que respiramos a grandes distâncias, e é capaz de permanecer na atmosfera por cerca de um mês até ser eliminado. E mesmo a substância tendo sido mapeada em altitudes elevadas, ventos fortes são capazes de trazê-la para baixo, o que afeta significativamente a qualidade do ar.
Greenpeace também se manifesta
Além de imagens da NASA, também podemos contar com o Greenpeace mostrando a situação, com uma série de fotos reais do que está acontecendo na região amazônica em 2019.
A entidade não-governamental atualiza os dados do INPE, afirmando que, de janeiro até o dia 20 de agosto, o número de queimadas na região foi na verdade 145% superior ao registrado no mesmo período de 2018. “As queimadas que estão devastando a Amazônia também estão destruindo a imagem do Brasil. Isso afeta nossa economia e pode agravar a crise econômica e o desemprego. Até mesmo setores do agronegócio já assumem que a política antiambiental do governo pode trazer prejuízos”, afirmou Márcio Astrini, coordenador de políticas públicas do Greenpeace. O presidente do Brasil chegou a fazer um pronunciamento em rede nacional a respeito, mas o governo ainda não anunciou medidas concretas para combater o desmatamento.
O desmatamento na Amazônia piora ainda mais o ciclo de destruição anunciado pela crise climática que vem sendo tão abordada por cientistas e especialistas em meio-ambiente no mundo todo: afinal, quanto mais desmatamento e queimadas, maiores são as emissões de gases de efeito estufa e, quanto mais o planeta aquece, maior será a frequência de eventos externos afetando ainda mais as florestas, bem como a biodiversidade e a saúde humana, inclusive.
“É urgente e necessário colocarmos um fim nesse ciclo vicioso, enquanto ainda temos tempo. Durante um sobrevoo na região da BR-163 pudemos observar as consequências reais do desmonte da agenda ambiental brasileira: extensas áreas desmatadas, cercadas de fumaça, denunciando o avanço da agropecuária sobre a floresta”, afirma Danicley Aguiar, da campanha Amazônia do Greenpeace.
E se a Amazônia acabar?
Quem também abordou o assunto foi Leandro Tavares Azevedo Vieira, professor de ciências biológicas na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Ele afirma que “ao contrário de outros biomas brasileiros em que a vegetação evolui com a presença de queimadas naturais e, portanto, apresentam adaptações para resistir ao fogo, a Amazônia nunca passou por tantos períodos de queimadas em seus últimos milhares de anos”, então não é aceitável o que está acontecendo, com a maior floresta tropical chuvosa do mundo queimando nessa intensidade, “pois as [queimadas] que ocorrem são todas de origem antrópica, ou seja, provocadas pelos seres humanos”, acrescenta.
O professor afirma que se tratam de “queimadas intencionais e que aproveitam o período mais seco para degradar e abrir áreas para uma pecuária extensiva com baixíssima produtividade devido ao solo relativamente pobre”, com o processo de desmatamento começando a partir da ação de madeireiros ilegais, que retiram dali as árvores mais valiosas, e depois promovem queimadas na época seca para “limpar” as áreas para a pecuária.
E preservar a Amazônia é importante por uma série de razões. “Primeiramente, a sua biodiversidade é única e que deve ser considerada como um patrimônio natural. O potencial econômico e sustentável de espécies amazônicas com finalidades diversas como fármacos, cosméticos e alimentícios é enorme”, fala o professor, que lembra da Lei da Biodiversidade de 2015, criada justamente pensando na proteção dos nossos recursos naturais.
Ainda, além da própria biodiversidade, a Amazônia tem papel importante como produtora de água. “Os conhecidos ‘rios voadores’, toneladas de vapor d’água que são evapotranspiradas pelas árvores e que chegam ao centro-oeste e ao sudeste, promovem as chuvas que abastecem os reservatórios hídricos e irrigam a agricultura”, ele explica. Esses “rios voadores” transportam mais de 20 trilhões de litros por dia, o que é maior do que a vazão do próprio Rio Amazonas, por sinal. “Sem esse recurso hídrico, corremos o risco de termos nossas hidroelétricas desabastecidas e, consequentemente, um risco real de uma crise energética, já que essa é a nossa principal fonte de energia”, explica o professor, reforçando que, caso isso aconteça, a solução para manter o abastecimento energético seria acionar as termoelétricas, que são altamente poluentes e excessivamente caras, além de tudo. E, além disso, “uma agricultura sem a água da Amazônia se reflete em um aumento dos custos e perdas de produção de alimento; assim, produção alimentar e preservação ambiental são complementares e nunca devem ser vistos como antagônicos”, constata.
E agora voltando a falar da liberação de carbono na atmosfera: o desmatamento é a principal fonte de gases de efeito estufa no Brasil e, com a participação do Acordo de Paris no combate ao aquecimento global, nosso país havia se comprometido com o desmatamento zero, alcançando bons resultados nos últimos anos. Só que agora o Brasil deu dois passos para trás e as queimadas se intensificaram.
Para o professor, “é natural e legítima a pressão de outros países para a preservação da Amazônia, pois ela não é dos poucos que se enriquecem queimando-a e desmantando-a ilegalmente sem, inclusive, pagar imposto ou gerar renda ao Brasil: a Amazônia é de todos, é da humanidade”. Ou seja: preservar seus recursos naturais é um investimento, não é algo que deve ser encarado como um gasto.
O professor encerra sua reflexão dizendo que “não podemos depender de nossa criatividade tecnológica, pois até hoje não conseguimos substituir a função de uma árvore, quem dirá de um ecossistema tão complexo; a Amazônia é de extrema necessidade para a sobrevivência humana”.
*Com informações de NASA
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