Massa de água quente do Pacífico afetou ecossistema e matou de fome 62 mil aves marinhas, diz pesquisa
A passagem da massa de água quente do Pacífico, conhecida como “The Blob” (a gota, em tradução livre), levou à fome e à morte ao menos 62 mil aves marinhas entre 2015 e 2016, de acordo com uma pesquisa publicada nesta quarta-feira (15) no periódico científico “Plos One”.
A estimativa é que 1 milhão de aves tenham morrido, já que somente parte dos corpos chegam à costa. A fome também interferiu no ciclo reprodutivo destas aves nestes dois anos. No estudo, os pesquisadores afirmam que o caso é “surpreendente e sem precedentes”.
Os registros foram feitos ao longo de 6 mil km de costa, da Califórnia ao Golfo do Alasca.
“Nosso estudo é uma janela para o futuro. Com o oceano se aquecendo, as espécies marinhas terão dificuldade se alimentar. A população vai diminuir e outras espécies de águas mais quentes poderão invadir este ecossistema” – Julia Parrish, pesquisadora da Universidade de Washington e segunda autora do estudo, em entrevista ao G1.
“The Blob” foi a maior onda de calor já registrada nas águas do Pacífico Norte, segundo dados da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês). Neste ano, ela está reaparecendo (leia mais abaixo).
Em 2019, a temperatura média dos oceanos atingiu o maior registro da história e bateu o terceiro recorde consecutivo. Os oceanos estiveram 0,075°C acima da média registrada de 1981 a 2010. Nas últimas seis décadas, essa temperatura subiu 450%,o que corresponde a uma elevação de 46 mm no nível dos oceanos.
“A equipe científica procurou outras causas possíveis [para a morte das aves], mas excluímos doenças e toxinas (por exemplo, devido a explosões de algas ou marés vermelhas). As carcaças de murre eram de muito baixo peso. Os pássaros não tinham gordura – estavam morrendo de fome”, explica Parrish.
Ondas quentes
O registro de ondas ou correntes de águas mais quentes que o usual têm se tornado mais frequente no último século. Os cientistas vêem no fenômeno uma evidência das mudanças climáticas nos oceanos, que pode levar a uma mudanças “irreversíveis e sem precedentes” no ecossistema marinho, de acordo com o estudo.
No final de 2013, a temperatura na superfície das águas no Golfo do Alasca (até 100 metros de profundidade) estava mais quente que o normal. O fenômeno sumiu ao longo do ano seguinte e voltou a reaparecer no final de 2014, atingindo a costa e persistindo durante o outono e inverno de 2015 e 2016.
A variação chegou ser de 3 a 6°C, do Sul da Califórnia até o Golfo do Alaska, a uma profundidade de até 200 metros. A situação foi classificada como “severa” pelos climatologistas devido à extensão, magnitude e duração da onda de calor.
Vida marinha
A morte em massa dos murres, relatada nesta pesquisa, se soma à lista de outras espécies afetadas pela massa de águas quentes.
Os primeiros efeitos provocados foram observados na população de fitoplânctons, que diminuiu nas águas do Norte do Oceano Pacífico; na proliferação de algas nocivas, que se estendeu da Califórnia ao Golfo do Alasca em 2015; e até na alta mortalidade de baleias, também no Golfo do Alasca entre 2015 e 2016.
Além destes pequenos animais, os peixes também foram afetados, diz Parrish. As águas mais quentes aceleram o metabolismo deles, exigindo mais comida para sobreviverem.
E as espécies grandes – como salmão ou bacalhau – se alimentam de peixes menores, como arenque, anchova, sardinha – a mesma fonte de alimentação dos murres.
“Quando a água esquentou, o mesmo aconteceu com os peixes (por serem de sangue frio, estão na mesma temperatura da água). E um peixe aquecido tem um metabolismo mais alto – ele precisa de mais comida para sobreviver. Portanto, a competição por escassos recursos alimentares dos grandes peixes predadores era muito maior. Os murres simplesmente não tiveram chance de sobreviver”, afirma Parrish ao G1.
O estudo foi feito com base em dados coletados por pesquisas sobre aves encalhadas no Nordeste do Pacífico, estudos do governo do Alasca, de universidades, organizações privadas, relatórios comunitários e registros de centros de reabilitação de aves.
‘The Blob’
“The Blob” é um gigantesco fluxo de água quente na costa oeste dos Estados Unidos, que ameaça causar devastação na vida marinha e na pesca nessa região. É a maior onda de calor já registrada, segundo a NOAA. As primeiras evidências surgiram em 2013 e persistiram até 2016. Neste ano, especialistas monitoram um possível reaparecimento do fenômeno (veja infográfico abaixo).
Segundo especialistas, o aquecimento se deve a um sistema de alta pressão que enfraquece os ventos que ajudam a misturar e resfriar a superfície do oceano.
Sem esses ventos, a temperatura da água aumenta e a corrente quente se move em direção à costa. O aquecimento das águas faz com que haja menos nutrientes no oceano, o que altera a cadeia alimentar.
Assim, por exemplo, os leões-marinhos precisam nadar mais longe para alcançar peixes e os outros animais que servem de alimento.
Esta massa de água quente criou a maior floração de algas tóxicas já registrada na costa oeste dos Estados Unidos. Essas algas nocivas, das quais pequenos organismos se alimentam, afetam toda a cadeia alimentar.
Por G1
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