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Em 15 anos, 1.558 pessoas morreram no mundo em defesa do meio ambiente

Por Amelia Gonzalez

Conflitos de terras provocam a morte de 7 pessoas em uma semana no Pará — Foto: Reprodução/TV Globo

Nos quinze anos entre 2002 e 2017, 1.558 pessoas em 50 países diferentes morreram por defender suas terras, águas e florestas não só de ataques diretos de pessoas como de grandes empreendimentos que visam ao lucro e não respeitam o meio ambiente.

Este número é mais do que o dobro de mortes de militares em guerras no Reino Unido e na Austrália, e quase metade do número de soldados norte-americanos mortos nas guerras do Iraque e Afeganistão desde 2001.

O Brasil e as Filipinas têm o maior número de mortes de defensores do meio ambiente, ligadas ao setor agrícola. Nosso país encabeça, sozinho, o número de assassinatos acontecidos por conflitos no setor madeireiro.

Na lista dessas vítimas estão ativistas comunitários, membros de movimentos sociais, advogados, jornalistas, funcionários de organizações não-governamentais, povos indígenas, membros de comunidades tradicionais, camponesas e agrárias, e aqueles que resistem ao despejo forçado ou outras intervenções violentas. Uma característica une as pessoas deste triste grupo: são pacíficas, sempre fizeram seu trabalho visando a proteger o meio ambiente ou o direito à terra.Os dados são de um estudo publicado na revista “Nature” de 5 de agosto e usam, entre outras, a pesquisa da ONG Global Witness. Este relatório traz outro dado: das 683 mortes que aconteceram entre 2014 e 2017, mais de 230 foram relacionadas ao agronegócio e à mineração, responsabilizando, portanto, também as grandes corporações. E cita que os “benefícios da exploração de recursos naturais em uma nação que se acumulam para outra nação” são um dos principais pontos de conflito.

“Os conflitos geralmente surgem em torno da extração de recursos por empresas ou outros sem direitos legítimos de uso – por exemplo, extração ilegal de madeira nas florestas comunitárias. Ou quando os direitos do usuário são concedidos por governos corruptos – por exemplo, acesso à água já utilizada pelas comunidades. Ou, ainda, por meio de processos políticos que não respeitam o consentimento livre e esclarecido prévio – por exemplo, a exploração de petróleo em concessões em territórios indígenas no Peru”, diz a pesquisa.

Detalhando os conflitos, que têm ocorrido com mais frequência do que se gostaria e que, infelizmente, têm se tornado um emblema dos dias atuais, o estudo faz ainda um comentário sobre o Brasil – “o país com maior número de mortes desse tipo, sobretudo de indígenas”. Segundo os pesquisadores, nosso país é hoje foco de preocupações, já que o governo de Jair Bolsonaro relaxou as leis que proíbem uso das armas, sobretudo no campo e as que protegem o meio ambiente.

“Ele (o presidente) rotula organizações não-governamentais e ativistas como terroristas para minar e reprimir os que estão em desacordo com o regime político”, dizem os pesquisadores.

Em geral, os conflitos que levam às mortes dos defensores do meio ambiente, como mostra o estudo, estão ligados a empreendimentos que usam diferentes recursos e são de diferentes setores. Os combustíveis fósseis estão na lista, além de minerais, madeira, agricultura, acesso à terra ou água.

As contendas são causadas, quer pelo deslocamento forçado para apropriação de terras, quer pela negação dos direitos de indígenas e de outros povos. É quando usuários tradicionais de recursos naturais são excluídos da terra, muitas vezes em nome da conservação de parques nacionais ou áreas marinhas protegidas que restringem atividade de pesca.

O Brasil é citado também por ter causado conflitos por conta da inundação de comunidades inteiras para a criação de hidrelétricas, como a de Belo Monte. Mas a mineração causou mais mortes nas Filipinas, Colômbia e Índia, enquanto Guatemala e Honduras tiveram o maior número de mortes relacionadas à água e represas. No Vietnã e na República Democrática do Congo as mortes por conflitos ambientais aconteceram por causa de caça ilegal.

Em países mais marcados pela corrupção e por um estado de direito fraco – Somália, Coreia do Norte e Afeganistão, por exemplo – o estudo mostrou que há menos ativismo ambiental . E isto pode estar ligado às mortes de defensores do meio ambiente nessas regiões. Mas até mesmo na Irlanda, que não se encaixa nestas características, houve crimes brutais contra pessoas que se insurgiram contra abusos de extrativistas.

Quando os assassinos de defensores ficam impunes, o problema se agrava. E esta impunidade, segundo os pesquisadores, está diretamente ligada a dois fatores:

“Em primeiro lugar, a corrupção nos ramos da polícia e do judiciário em muitos países significa que os casos não são devidamente investigados ou julgados. Muitas vezes, as próprias autoridades policiais e/ou governamentais são diretamente responsáveis pela violência ou têm laços financeiros e /ou familiares com os responsáveis. O massacre de dez ativistas da terra em Pau d’Arco, no Pará, há um ano é um dos casos em que a polícia civil é suspeita. Em segundo lugar, porque os assassinatos ocorrem em áreas remotas com pouca presença do governo e da polícia, o que aumenta a dificuldade de coletar evidências”, diz o estudo.

Movimentos sociais pedem justiça pela chacina de Pau D’arco, em que 10 posseiros foram mortos. — Foto: Tarso Sarraf/ O Liberal

Existe um acordo assinado na América Latina e Caribe, chamado Acordo de Escazú, que entre outras coisas visa a assegurar a participação pública nos processos de tomada de decisões ambientais e acesso à justiça em questões ambientais.

Até agora, o Acordo foi assinado por 17 países, entre eles o Brasil. O Chile, país que vai sediar a próxima reunião sobre o clima convocada pela ONU (a COP25), ainda não assinou o Escazú (nome da cidade, na Costa Rica, onde os governantes se encontraram para chegar ao tratado).

Como sabemos, para um país sediar um encontro tão importante, em que são envolvidas mais de 30 mil pessoas, não basta oferecer belos recantos turísticos ou que as autoridades façam bons discursos. É preciso mostrar engajamento no tema.

E, a julgar pela obviedade e pelo estudo publicado pela “Nature”, avaliar a importância dos defensores do meio ambiente é um passo largo dado em direção a este engajamento.

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