Conheça o mão-pelada, único guaxinim que vive no Brasil
Famosos nos filmes e séries americanas, os guaxinins são muito conhecidos pela plumagem volumosa, rabo listrado e um detalhe nos olhos que lembra uma máscara. O que pouca gente sabe, porém, é que o Brasil abriga uma espécie da mesma família, popularmente conhecida como mão-pelada (Procyon cancrivorus).
De porte médio, o mamífero ocorre em todos os domínios naturais brasileiros, mas é pouco conhecido pela população. “Apesar de ser muito comum no Brasil inteiro, é muito difícil capturá-lo em armadilhas e observá-lo na natureza, por isso, poucos conseguem estudar mais a fundo a sua biologia ”, explica Carolina Carvalho Cheida, bióloga que dedicou as pesquisas de doutorado ao mão-pelada no Pantanal, em parceria com a Embrapa.
Durante os estudos em Corumbá, Pantanal Sul, Carolina contou com a ajuda de pesquisadores e funcionários das fazendas para capturar 15 indivíduos e monitorar a maioria deles com rádio-colar. “Depois de anestesiados nós tínhamos quarenta minutos para avaliar o animal, coletar sangue, fazer as medições, colocar o rádio-colar e um chip subcutâneo, importante para evitar que cadastrássemos novamente um animal já avaliado. Em seguida, colocávamos em uma armadilha camuflada até passar o efeito anestésico e realizávamos a soltura, ainda durante a noite”, conta.
O desafio foi grande, mas rendeu observações importantes para o estudo da espécie. “No Pantanal o mão-pelada passa o dia inteiro dormindo e, entre o fim da tarde e a noite, sai para se alimentar. Com frequência observei os animais dormindo em meio aos caraguatás, plantas espinhosas que dificultam a entrada de predadores”, lembra Carol, que destaca o comportamento de caça do animal.
“Além de se alimentar de frutos e insetos dentro das matas, a espécie caça com frequência na água. Diferente do cachorro-do-mato, que fica na borda capturando insetos, caranguejos, frutas e anfíbios, o mão-pelada coloca as mãos dentro da água e da lama na tentativa de capturar esses animais”, revela.
“O que me fascina nas espécies como mão-pelada, cachorro-do-mato e lobo-guará, por exemplo, é o fato de pertencerem a ordem Carnivora, mas seguirem uma dieta onívora (alimentação de insetos, outros animais e frutos), o que os tornam importantes dispersores de sementes. É claro que temos os grandes dispersores, como as aves, os morcegos e as antas, mas esses animais também estão ajudando”, completa.
A pesquisadora reforça que as informações levantadas sobre o comportamento da espécie são relacionadas aos indivíduos que vivem no Pantanal, escolhido para os estudos, mas que os hábitos do mão-pelada podem ser diferentes em outras regiões do Brasil. “Tenho vontade de voltar a pesquisar a espécie em outros lugares, justamente para entender onde costumam se abrigar, por quais ambientes se deslocam, os horários de atividade e outros comportamentos que variam de acordo com as características do ambiente”.
Único representante do gênero no Brasil, o mão-pelada possui “parentes irmãos”, espécies da mesma família distribuídas pelas Américas. “Além do raccoon-do-norte (Procyon lotor), o famoso guaxinim dos filmes que ocorre na América do Norte e Central, existe o raccoon-pigmeu (Procyon pygmaeus), que é exclusivo da Ilha de Cozumel, na América Central”, explica Carolina.
Aqui, o mamífero se assemelha a outras espécies, como o quati e o jupará. “As pessoas confundem bastante o mão-pelada com o quati, principalmente por apresentarem o rabo listrado. No entanto, os quatis geralmente possuem pelagem mais clara, puxada para o avermelhado e o dourado, além de ter o nariz muito mais afinado e o rabo empinado”, detalha.
A bióloga destaca ainda que o comportamento das espécies é oposto: enquanto os quatis são mais desinibidos e possuem hábitos diurnos, os mão-pelada são noturnos e extremamente tímidos.
A espécie não é citada na lista brasileira de animais ameaçados e é classificada como espécie não ameaçada (LC) na lista vermelha da IUCN. No entanto, atropelamentos, poluição dos recursos hídricos e fragmentação dos habitats são ameaças ao mamífero
Ciência e conservação
Carolina explica que descobertas como essas são extremamente importantes para a conservação do meio e das espécies. “Ainda é comum que as pessoas prezem pela proteção das florestas e não se preocupem com a conservação de outros tipos de vegetação, como os campos naturais e o Cerrado, por exemplo. No caso do mão-pelada, ambas são áreas de ocorrência da espécie, por isso a importância de divulgarmos as informações. A partir do momento que eu comprovo que o animal passa uma parcela do tempo naquela determinada área, fica claro que a diminuição ou destruição do local irá prejudicá-lo”, comenta.
“O ideal é que essas descobertas sejam repassadas para órgãos ambientais e secretarias. Assim, as informações podem ser usadas na prática em prol da conservação das espécies”, completa.
Por G1
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